Terminados os jogos da 30ª olimpíada entramos no famoso período de análise do desporto português, onde se debatem os
temas de sempre, chegando-se inevitavelmente às conclusões de sempre. Assim resta-me colocar em palavras, para possível memória futura, alguns momentos, reflexões e opiniões para que daqui a 4 anos possa ter uma base de comparação para os jogos olímpicos do Rio de Janeiro.
Começando pelos aspectos negativos (para que possa terminar com o que realmente vale a pena) gostaria de salientar a forma como, salvo algumas excepções, a comunicação social portuguesa fez a cobertura destes JO.
Visto aqui.
Olhando para as capas dos jornais do dia seguinte à cerimónia de abertura destes JO podemos facilmente compreender o que representa a palavra 'desporto' para o jornalismo português. Ora, se quem devia ter por obrigação dar o devido destaque ao início do maior evento desportivo do mundo não o faz, como queremos que um país siga com a atenção merecida os atletas que lá estiveram a representar o país?
Tivemos 80 horas de transmissão diária por parte da RTP, que abriu inclusivamente um canal pago para emitir 24 horas por dia exclusivamente competições integradas no programa olímpico. Então mas e isto:
Canal RTP Olímpicos na TDT ? Sei que estamos em 2012 e já grande parte da população tem acesso à televisão paga, mas como é que se inspira uma geração em Portugal, tal como sugere o lema destes JO?
Isto para não falar do grande desconhecimento ou, pelo menos, falta de trabalho de casa, por parte de apresentadores de programas de televisão dedicados aos JO, onde as modalidades dos atletas são trocadas, os atletas ganham novos nomes ou, se tudo isto acabar por não acontecer, a notícia é dada de uma forma negativa. (Felizmente há excepções e por isso leiam até ao fim)
Exemplo:
Sara Moreira termina em 14º e falha objectivo
Sara Moreira fez o seu melhor tempo pessoal! Não deveria ser esse o destaque da notícia, havendo um 'no entanto' para o facto de ter falhado o objectivo top10?
Quando se fala em falta de preparação ou experiência dos nossos atletas não seria melhor falar antes em falta de preparação ou experiência dos nossos jornalistas para o desporto não-futebol?
Todos os atletas que foram aos JO conseguiram o apuramento por mérito
próprio, cumprido mínimos ou alcançando lugares de qualificação. Quando
se fala em atletas que vão passear, quantos deles não puderam passear
durante 4 anos para conseguirem chegar a esses resultados? Apostamos
apenas em meia-dúzia de atletas? Numa só modalidade? Se os portugueses querem apostar em futebol alguém explica o porquê do futebol não conseguir lá estar?
Mas passemos ao lado positivo desta edição dos jogos.
Antes de partir para o inevitável que é enaltecer a medalha alcançada pelos canoístas portugueses Emanuel Silva e Fernando Pimenta fica um resumo das classificações dos atletas portugueses:
Classificações dos atletas portugueses nos Jogos Olímpicos de Londres 2012
O destaque:
Por 53 milésimos que não alcançaram a primeira medalha de ouro para Portugal noutra modalidade que não o atletismo.
E que felizmente conseguiu arrancar as primeiras páginas dos jornais portugueses:
De entre muitas histórias que surgem no decorrer de uns jogos, o caso de Clarisse Cruz, por ser portuguesa foi a que mais me inspirou.
A história dela é esta:
LINK
Na dita qualificação acabou ultrapassada pela espanhola na recta final mas chegou à final da prova por repescagem com um tempo que bateu em 10 segundos o anterior recorde nacional. 10 segundos! Uma final inédita para Portugal. Já na final ficou em 11º e não voltou a bater o recorde, mas aquele 11º foi ou não uma vitória?
A todos os outros atletas portugueses quero deixar aqui o meu obrigado. Obrigado por carregarem neles as esperanças de todos os que já fizeram desporto de competição. O de lá estar, o de participar, o de viver os Jogos e dar o máximo na sua prova, naquele dia, levando ao peito a nossa bandeira, pois independentemente daquilo que se possa dizer depois da prova acabar só quem participou de bandeira portuguesa ao peito sabe o que isso realmente representa.
Sei que isto acaba por ser insignificante face aquilo que realmente precisamos no desporto em Portugal, mas pelo menos eu já fiz a minha parte.
Para terminar cito João Pedro Mendonça, jornalista da RTP, que durante a prova de triatlo masculino disse o que a seguir cito, num claro exemplo de que os bons profissionais existem, só é preciso que tenham cultura desportiva para olhar para o desporto, não só para aquilo que movimenta milhões, mas também para o que realmente nos deve, ou deveria, orgulhar.
"O que de bom tem os JO não são só as medalhas ou os recordes do
mundo... é ver a qualidade do desempenho, o empenho sobretudo e a forma
como todos se entregam à luta."
"Em Portugal mais facilmente se discutem, quase sempre as medalhas
e o ouro e os diplomas e mais facilmente se transporta a frustração do
dia-a-dia para os resultados desportivos (...) na forma como quase todos
os atletas de praticamente todas as modalidades são ostracizados."
"Parabéns a todos os que dão tudo. Sejam últimos ou não. Pergunto eu: não merece o mesmo aplauso o último da maratona (...) como o primeiro?"
Agora acabem lá com as reflexões pós-JO, defina-se 'desporto' em Portugal e mãos ao trabalho que 2016 está já aí.
E porque as imagens valem mais que mil palavras, o meu desejo é que a imagens como a 39 possam ter maior destaque:
London 2012 Olympics: Winning moments